E lá estavam as duas grande amigas e companheiras, uma sentada a
mesa iniciando a refeição. Dentro de alguns minutos deveria voltar
ao trabalho; bem próximo de onde mora. Isso lhe permitia almoçar em
casa todos os dias. Já a outra, a mãe, estava a beira da pia já
adiantando a lida para se permitir um descanso durante a tarde, de um
modo ou outro já tinha umas pernadass de vida a mais que a filha
caçula.
Conversavam sempre, assunto sempre havia em base de respeito mútuo.
E diga-se de passagem : ah, como havia um conta de vida alheia no
meio dessas conversas.
Enquanto uma cuidava das coisas sobre a pia a outra almoçava
vagarosamente. A mais velha lhe perguntou o que estava acontecendo. A
resposta foi certa, simples e objetiva. 'Saudade, mãe!'
-- E quando é que ele volta?
-- Dia vinte e sete.
-- Come tudo menina, se não já sabe!
-- Não se preocupe não, estou me alimentando direito, é que a
minha cabeça vai longe e esqueço de por a comida na boca. Sinto
fome sempre, mas a saudade a obscurece um tanto.
-- Será que ele vai te trazer presente?
-- Sei lá mãe! Pelo que conheço é capaz de aparecer com uma coisa
que eu nem sei o que é, e vai me contar uma história tão comprida
e cheia de floreios sobre o significado do lugar onde comprou, quem
passou por lá nos séculos anteriores, etc. Sabe-se lá! Bem
possível até de me aparecer com uma pedra que achou bonita no meio
do caminho. Ah mãe, você sabe como ele é, e além disso foi com o
dinheiro curto, bem possível gastar tudo em comida e bebida e se
esquecer de me comprar algo... Não me importo, quero que ele volte
logo.
--É verdade menina! Como é que pode beber e comer daquele jeito e
não engordar? Quando vocês comem aqui no fim de semana eu fico
olhando ele comer... Na verdade eu gosto qundo ele come daquele
jeito, é que ele cozinha tão bem... se come minha comida assim é
porque deve ser boa mesmo.
--Mãe, você está maluca? Sua comida é ótima, ele detesta feijão
e a senhora nem sabe.
--Verdade? Mas por que ele sempre repete o arroz e feijão, sem pegar
mistura?
--É que ele diz que seu feijão é mágico.
A mãe vendo a filha quase a terminar com a comida do prato
tranquilizou-se e voltou a pia. De repente um silêncio. Volta-se
para trás e olha para a mesa : a filha havia comido toda a comida
com exceção de uma azeitona, para a qual olhava e chorava sem
parar.
--Tudo bem filha, logo ele volta, come a azeitona pra mim lavar o
prato.
--Não consigo mãe, ele sempre pede as azeitonas do meu prato.
--Essa você pode comer, não tem caroço.
--Como assim?
--Ele me disse uma vez que não gosta de azeitona sem caroço, não
tem graça! Você não sabe disso?
--Sei sim mãe, mas quem come as azeitonas do meu prato é sempre
ele, com ou sem caroço. Come a senhora, senão me atraso pra voltar.
E a 'menina' levantou-se fez sua higiene, despediu-se da mãe e saiu.
A mãe ficou olhando o prato, a azeitona e sentiu saudade do genro.
Chamou o cachorro e deu a azeitona pra ele, lavou os últimos
utensílios e pensou : 'Afinal, às vezes ele dava uma azeitoninha pro
cachorro. Não ia se incomodar.'