sexta-feira, 23 de novembro de 2012

A coisa


Considerar ter
Como ser
Pra não ser sem ter
E ter que ser
E ter coisas
E pensar em ter pra querer ser
E tornar-se coisa
E apenas não um ser
Ter pra pensar
E no que pensar
Ter apenas
Pensar em coisas pra ter
E sentir como uma coisa
Que só pensa em ter
E não sente o ser
E não é
Só tem
E só é coisa
Que não tem o que é ser
E nem o que tem.

Existência


Existência

 I - Exausto 

Ando exausto
Exaurido
Talvez Fausto.

Enfadado
Entediado
Querendo êxtase
Onde deveras
Outrora tivera

Entrego-me à proposta
De Mefisto
Tentação!
Não imposta.
Tão somente mostrada
Como deliciosa salsicha
Coberta de escura mostarda

Nem isso mais me agrada
(Como comer um dia foi prazer)
Nem isso e nem mais a amada
(Como amar um dia foi suficiente)

Fausto seja-me
Por um instante.
Talvez sinta-se melhor.

Eu, ser gritante
De energia,
Esfuziante,
Transbordante.
Perdi-me dos valores
Ausentei-me
De minha própria presença
Para querer ser Tudo,
Não ser Deus,
Ser sim Tudo
Que pensamento,
Sentimento
E conhecimento
Alcançassem

Levado
À exaustão
Tentação
Quase-Morte
Desordem
Confusão.

E conclusão:

Ser o que devo ser:
Nada!
Sentir o que quero sentir:
Nada!
Estar onde quero estar:
Lugar nenhum!
Viver o que quero viver:
Morte!

Descanso
Da loucura
Da sede
De saber, sentir, ser, existir, querer, querer, querer...

II - Intervalo

Ficar enciumado
Ver a bela de Tróia ser abraçada
Tornar-me abstêmio de consciência

Por um instante
Ausência


III - O feito de Wagner

Descontente com o admirado.
Ter entregado
A essência do ser
A troco do vil prazer,
Saber.
Insana atitude
Reaver
Juventude

Muitos fatos
Alguns mortos
Virgem não mais
Agora enlouquecida
No cárcere esquecida
Gretchen
ou
Margarida?

Discípulo
Orientado
Que assim fizesse
O ser minúsculo
Mesmo sendo
Ausente o mestre.
Homúnculo
Criado
Engarrafado
Alma e Espírito
Presente
Em chamas
Corpo material ausente

Um ser sedento,
Estar fora
Do frasco
Que de dentro faz
Sentir a vida sem corpo fiasco

IV - Morte

Alma devida
Ao que sempre me segue

Matéria tornada significante
Escusada ao limbo
Nem por onde se quer
Haja uma brisa soprante.

Quase sem ânimo!
Sem Margarida,
Sem Helena.

A alma,
Sedenta de calma.
Agora pequena
É só pena.

O que me constitui ser animal
Já não me quer mais
Espero um ritual
Ser a penas, o que jaz.

Nunca serei
Como outrora
Maldita hora
Não saberei

Velório insólito a realizar
Ninguém a chorar
Ou a enterrar-me
A dívida veio cobrar-me.

Comovida
Intercedeu Maria,
A pedido de Margarida,
Devolveu-me alma
Para ser de fato,
Ter vida morrida.

Toca-me, Margarida, com tua mão de veludo
Ao teu amor devo tudo.
Enfim absolvido de minha ganância
E morto na ignorância.

terça-feira, 20 de novembro de 2012

eu vi!

(arte de Marcelo Castro)

vi uma multidão perdida,
e a solidão perdida
na multidão de pessoas perdidas

domingo, 11 de novembro de 2012

Palavras usadas


As palavras têm sempre poder
Trazem de volta vida a quem não as tem mais
Palavras têm poder de fazer sonhar
Às vezes quem nem dorme
Ou as que o sono levam antes de pensá-las

Fazem sonhos e castelos de papel
De caminhos traçados num espaço
Que certamente deixado de lado
Será esquecido, devorado por traças

Palavras de trapaça, desamor, desgraça
Malditas e mal lidas e mal ditas e mal amadas

Palavras lidas
Palavras ditas
Imaginadas
Desenhadas e castradas
Sonhadas e por fim escritas

Mal escritas ou apenas e tão somente
Sozinhas descritas
Explicadas e definidas
Infinitas palavras coitadas

Sempre usadas!

domingo, 4 de novembro de 2012

Triste canção para Jill


Ela abre a porta e adentra o quarto escuro
Segurando apenas um toco de uma vela acesa por entre os dedos
A menina prostra-se diante de sua janela
Descansa a vela no parapeito, abre a janela...
Um forte vento apaga a luz da vela
E traz junto dele a luz intensa de um sol
O sol de uma manhã de dezembro
O ar úmido e o verde intenso do pasto
Diante de seu quarto, de sua janela
Ela vê...

Um cavalo branco
Um cavalo negro
O branco cabisbaixo
E como se fosse um negativo
O negro robusto, alegre e de boa aparência

A menina se faz duas dela mesma
De duas partes diferentes como os dois animais
Uma delas permanece apreciando a vista
A outra encosta metade da janela
Uma quer a luz do sol
Enquanto a outra quer a escuridão
Com a parca luz do resto de vela

Uma quer ver o verde, o negro, o branco, o azul
A outra não quer ver, quer só ouvir
Sua nova preferida canção
“Half Jill and half Jack”, é esse o refrão
Que cambaleia em um seu ouvido
E um relinchar do corcel negro no outro ouvido seu

“Run Jack, see Jack”

O vento forte abre a metade da janela
E o desejo da outra metade dela extingue a luz...
Já era a luz da vela!

O relinchar do corcel abafa o refrão
Um olho dela se fecha para não ver a luz
Um outro olho seu mantém-se aberto
A cuidar da tristeza do animal branco

Talvez batize a ela: Jill
E ao corcel: Jack
E cante para eles uma nova canção:

“Half big 
Half ill
How  Black 
Is Jack
How evil 
Is Jill
They are me
And they are mine
Half white 
Half black
Run Jill 
To the vine
Hide from Jack
When it is on time”

quinta-feira, 1 de novembro de 2012